[Para além da Superfície] #21: Possibilidades e Realidades
Eu sou apaixonada pela possibilidade. Sou apaixonada pela liberdade.
Em saber que eu posso escolher qualquer coisa que eu quiser. Em saber que tenho opções.
Mas essa paixão é tão grande que qualquer decisão me parece um sacrifício.
Eu AMO poder escolher, mas odeio escolher em si. Entende?
No extremo da valorização da liberdade, qualquer decisão parece uma prisão.
Ao fazer uma escolha, me prendo à ela. E por me prender, perco a minha Liberdade.
Paradoxal, né?
Mas de que vale a possibilidade de escolha sem que ela se materialize no mundo real?
Sylvia Plath, em seu livro “Redoma de Vidro”, escreve:
“Eu via minha vida se ramificando à minha frente como a figueira verde daquele conto Da ponta de cada galho, como um enorme figo púrpura, um futuro maravilhoso acenava e cintilava. Um desses figos era um lar feliz com marido e filhos, outro era uma poeta famosa, outro, uma professora brilhante, outro era Ê Gê, a fantástica editora, outro era feito de viagens à Europa, África e América do Sul, outro era Constantin e Sócrates e Átila e um monte de amantes com nomes estranhos e profissões excêntricas, outro era uma campeã olímpica de remo, e acima desses figos havia muitos outros que eu não conseguia enxergar. Me vi sentada embaixo da árvore, morrendo de fome, simplesmente porque não conseguia decidir com qual figo eu ficaria. Eu queria todos eles, mas escolher um significava perder todo o resto, e enquanto eu ficava ali sentada, incapaz de tomar uma decisão, os figos começaram a encolher e ficar pretos e, um por um, desabaram no chão aos meus pés.”
Eu não sou a pessoa que vai dizer que você deveria escolher apenas um figo. Na minha concepção, temos váaarios figos ao longo da vida. Às vezes, vários figos até no mesmo momento.
Mas eu acho que por muito tempo eu me iludi achando que ia ter um figo que eu ia pegar, uma decisão que eu ia tomar, que me daria a sensação de completude, de realização, de “Nossa!!! Era isso!!”
E é isso que isso é: uma ilusão.
Escrevo esse texto, ou melhor, dito para o bloco de notas do meu celular (tecnológico, né?) no escuro do meu quarto, às 2h da manhã.
Eu AMO essa privacidade, amo ter o meu espaço e, para ser bem sincera, não sou muito fã de dividir quarto (apesar de 90% das minhas viagens serem em quartos compartilhados de hostel). Mas a questão é: eu gosto muito desse pequeno espaço, mas eu gosto do resto do contexto dele?
Quando eu penso em sair pra viajar, em talvez virar nômade, eu já implico dormir com mais frequência em quartos compartilhados. E eu já tentei imaginar: eu em uma cidade nova, em uma casa só minha, em um quarto só meu, completamente sozinha. Não gosto da ideia. Uma vida compartilhada faz muito mais sentido para mim, neste momento. Mesmo com toda a perturbação que é acordar com o ronco de outra pessoa, com o barulho de alguém chegando no meio da noite ou de não conseguir ficar sentada na cama porque a sua é a cama do meio da triliche - acontece às vezes KKKKKKKK.
O meu ponto aqui é que não existe plano perfeito. (Na verdade, o plano pode até existir - porque ele ta só no mundo das ideias, e nesse plano você pode se iludir o quanto você quiser.) Mas não existe a ação perfeita. Não existe algo que vai ter dar absolutamente tudo o que você quer. Nenhuma experiência vai ser 100%.
Sempre vai faltar algo. Sempre vai ter algo que é melhor em algum outro lugar. Sempre vai ter algo que você não gosta…
E eu já fiquei muito travada nessa ideia do 100%.
Quando pensava na minha “carreira dos sonhos”, pensava em algo que eu sempre ia gostar de fazer, que não iam ter atividades chatas, monótonas, que eu sempre iria me sentir bem, feliz, realizada. E que se eu não me sentia assim hoje, era porque ainda não tinha achado a tal da “carreira dos sonhos”. E aqui você pode trocar “carreira” por qualquer outra palavra.
Qualquer trabalho, até o dos sonhos, vai ter coisas que você não gosta de fazer. É que o que a gente tem como ideal é bem diferente do que acontece na realidade.
Eu vivi o meu sonho. Morei 8 meses na Holanda. E o sonho, na prática, foi bem diferente do que eu imaginava. Eu queria uma vida de república, daquelas do interior de São Paulo, sabe? Agitada, cheia de gente, festeira. E tive o oposto, uma experiência muito mais solitária. Ainda assim, eu realmente estava vivendo o meu sonho. E mesmo vivendo o sonho, não eram todos os dias que eram incríveis, maravilhosos, cinemáticos…
Ta aqui a prova - Post de 8 de Fevereiro de 2022
Porque um sonho quando se concretiza vem assim: pedaços de sonho com pedaços de realidade, tudo misturado. E cabe a você manejar as suas expectativas e aprender a se maravilhar com o que ainda é sonho e a lidar com o que veio como realidade.
Achar que você não está sentindo o 100% porque “ainda não chegou lá”, porque ainda não achou *A* coisa que deveria estar fazendo, porque ainda não achou *O* lugar, é depositar toda a sua felicidade no futuro, ainda pior, em uma ilusão de futuro, porque A coisa e O lugar não existem. Tudo tem suas partes boas e ruins. Até as coisas que você mais ama tem um custo pra você.
Não existe plano perfeito. Mas qual mais te agrada? Qual você consegue suportar as partes não tão boas?
Como eu ouvi em algum lugar:
“Qual bolo de merda você está disposta a comer por aquilo que você quer?”
Neste momento, eu tô disposta a dormir no meio de estranhos se isso significar acordar todo dia na frente da praia…
✨Minhas Aleatoriedades da Semana
Falando sobre a vida compartilhada, um vídeo que eu amei fazer:
Liniker lançou música nova - já ta dando vontade de se apaixonar de novo:
“Um Pequeno Favor”, na Netflix. Fazia tempo que eu não via um filme que me prendia tanto. Fica a recomendação para vocês nesses dias frios em SP…
Às vezes eu preciso me lembrar que nem tudo ta aqui para ser resolvido…
🤝 Troca comigo?
Você já conseguiu algo que você queria muito e ficou com a sensação de “Não era assim de eu deveria estar me sentindo”? Me conta um pouco das suas expectativas vs realidades…